quinta-feira, 29 de maio de 2014

Expansão produtiva sustentável

Ao contrário do que se alardeia, a agricultura brasileira tem dado enorme contribuição para reduzir os impactos das mudanças climáticas
A chamada crise climática global, aliada aos prognósticos de que o aquecimento do planeta se intensificará e provocará impacto "grave, abrangente e irreversível", como consta do relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas das Nações Unidas (IPCC, na sigla em inglês), invariavelmente coloca a agricultura brasileira no centro das discussões.
Isso é compreensível. O Brasil é hoje, no cenário mundial, um dos principais produtores agrícolas e um dos maiores exportadores de alimentos. Enfim, o mundo depende da produção de grãos e de proteína animal. E a tendência é que tenhamos um papel cada vez mais preponderante no mercado agrícola global.
Mesmo assim, causa estranheza --e até certa indignação-- tentativas de setores ligados ao movimento ambientalista --muitos dos quais suspeitos de serem financiados por mercados concorrentes-- de atribuir à agricultura brasileira desinteresse em contribuir para a redução dos efeitos da crise climática global no país, como se isso dependesse fundamentalmente da ação dos nossos produtores de alimentos.
Ao contrário do que alardeia a corrente que historicamente se opõe ao avanço agrícola do país, a agricultura brasileira tem dado enorme contribuição nos últimos anos para reduzir os impactos das mudanças climáticas.
As estatísticas comprovam que a expansão da agricultura brasileira se deu em bases sustentáveis. Nos últimos 25 anos, por exemplo, a área plantada se expandiu 63% enquanto a produção de alimentos aumentou 230%. Como a agricultura brasileira alcançou esse invejável desempenho? Com aumento de produtividade, claro, somando à fertilidade da terra, à abundância de água e à intensidade do sol pesados investimentos em tecnologia, pesquisa e inovação, feitos tanto pelo setor público como privado.
Não é por acaso, portanto, que a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) seja considerada atualmente a mais respeitável instituição em pesquisa em agricultura tropical do planeta.
Com iniciativas gestadas em nossas instituições de pesquisas e com desprendimento de nossos produtores, estamos na vanguarda da execução de práticas agrícolas inovadoras, voltadas à redução de efeitos prejudiciais ao ambiente e à busca de sustentabilidade --na qual estão envolvidos aspectos econômicos, sociais e o respeito ao equilíbrio e a restrição dos recursos naturais.
Entre essas ações, está o Plano ABC - Plano Setorial de Mitigação e de Adaptação às Mudanças Climáticas para a Consolidação de uma Economia de Baixa Emissão de Carbono na Agricultura, desenvolvido pelo Ministério da Agricultura em parceria com o setor produtivo.
Com vigência entre 2010 e 2020, o Plano ABC contempla sete programas: recuperação de pastagens degradadas, integração lavoura-pecuária-floresta e sistemas agroflorestais, sistema plantio direto; fixação biológica de nitrogênio, florestas plantadas, tratamento de dejetos animais; e adaptação às mudanças climáticas.
Dos sete programas, seis envolvem diretamente tecnologias de mitigação das mudanças climáticas e um prevê ações de adaptações às alterações do clima. O setor brasileiro está, portanto, na dianteira da disseminação de tecnologias de produção sustentáveis na agropecuária para reduzir a emissão de carbono na atmosfera.
Por isso, no que depender do Brasil e de sua agricultura o mundo conseguirá atenuar os efeitos da chamada crise climática global, além de prepará-lo para saber lidar com tal situação. Esta é a minha convicção. Espero que o exemplo brasileiro seja objeto de análise durante a Conferência do Clima em Paris, em 2015.

quarta-feira, 21 de maio de 2014

Gargalos do agronegócio


O Plano Agrícola e Pecuário 2014/2015, principal instrumento do governo para o setor, oferece R$ 156,1 bilhões em créditos subsidiados, mas foi recebido sem grande animação pelos produtores rurais.
Como nos últimos anos, houve aumento no volume de financiamento para custeio da safra e investimento em máquinas e equipamentos. Pouco se falou, porém, sobre mudanças relevantes na infraestrutura de transporte, o principal gargalo do agronegócio.
A logística, com efeito, é o maior freio à competitividade. O custo para levar uma tonelada de soja de Mato Grosso até a China já vinha muito acima dos padrões internacionais; para piorar, neste ano registra-se um aumento de 50% em relação ao período 2010-2013.
Há, além disso, deficiências de armazenagem. Enquanto os EUA têm capacidade para estocar mais de 100% de sua safra, o Brasil não consegue abrigar mais que dois terços da produção nacional.
A combinação de transporte ruim e ausência de armazéns fragiliza os produtores, que se veem obrigados a escoar a safra a quase qualquer custo e sob condições adversas no momento da colheita.
A esses dois problemas soma-se um terceiro: o setor sofre de insuficiência de seguro para a safra. Estima-se que os R$ 700 milhões previstos para essa finalidade neste ano bastem para garantir cerca de 20% da área plantada. Nos EUA, a maior parte da produção conta com proteção contra intempéries e mesmo redução de preços.
Algumas prioridades precisam ser revistas por aqui. Não parece a melhor aplicação de recursos públicos, por exemplo, subsidiar, via BNDES, a aquisição de máquinas por grandes produtores. Valeria mais atender demandas que beneficiem a todos de forma horizontal, como nos casos da armazenagem e do seguro de safra.
Com uma produção estimada de 191 milhões de toneladas em 56,3 milhões de hectares, o setor responde por aproximadamente 60% das exportações brasileiras. Como um todo, o agronegócio representa entre 20% e 25% do PIB do país.
A evolução do segmento, que vem de longa data, deve muito, sem dúvida, às políticas de Estado construídas ao longo de décadas; seus resultados formidáveis, ainda assim, ocorrem a despeito da incapacidade de sucessivos governos de lidar com os problemas sistêmicos de infraestrutura. Folha, 21.05.2014.