quarta-feira, 26 de março de 2014

Setor de café vê alta de preços com cautela

Apesar da forte alta no preço do café nos últimos meses, o clima é de cautela no setor.
O presidente da OIC (Organização Internacional do Café), Robério de Oliveira Silva, afirma que é preciso evitar uma onda de euforia entre os produtores, que viram os preços internacionais subir 58% só neste ano.
Para ele, o mercado está no início de um círculo virtuoso, que será caracterizado por maior equilíbrio entre oferta e demanda. "Mas não é uma bonança."
"É preciso tomar cuidado para não estimular aumento na produção. Precisamos ser realistas, não eufóricos", disse Silva, que esteve ontem em São Paulo para o Global Agribusiness Forum.
Segundo Silva, o consumo mundial continua vigoroso, com taxa de crescimento de 2,5% ao ano, mas é preciso evitar que a oferta cresça a um ritmo superior à demanda.
Na avaliação dele, os preços estão num "patamar aceitável" para remunerar o produtor e incentivar mais investimentos em tratos culturais.
Dessa forma, será possível recompor os estoques mundiais, mas sem provocar o excesso de oferta que, nos últimos anos, levou os preços a um patamar inferior aos custos de produção.
Silva considera um intervalo confortável para o cafeicultor valores entre 1,70 e 2,00 centavos de dólar por libra-peso. Ontem, o primeiro contrato de café fechou a 1,75 centavos de dólar por libra-peso na Bolsa de Nova York.
Na Bahia, o ambiente está longe da euforia temida pela OIC. Como o Estado passou por três anos de seca e de prejuízos, João Lopes Araújo, presidente da Assocafé (associação dos produtores de café da Bahia), afirma que os produtores ainda demoram para se recuperar.
Ele diz que a tendência é a retomada dos tratos culturais, como adubação e irrigação, mas que o ambiente ainda não favorece expansões.
"Para que o investimento volte com força, é preciso que os preços retornem ao mesmo nível de 2011", disse o produtor, que chegou a receber R$ 530 por saca de café gourmet na época --hoje, ela é negociada perto de R$ 400.
Para ele, o momento atual revelou grande vulnerabilidade do produtor aos "movimentos especulativos", tanto na alta como na baixa, e é preciso aumentar as ferramentas de apoio ao cafeicultor.
Moratória O atraso na regulamentação do CAR (Cadastro Ambiental Rural) preocupa o Greenpeace, que participou das negociações para o fim da moratória da soja a partir de 2015.
Motivo Se o CAR não sair em breve, os compradores da soja brasileira ficarão sem garantia de que o grão não vem de áreas desmatadas.
Culpa Segundo Gabriela Vuolo, do Greenpeace Brasil,a responsabilidade não é só do governo, que avisou a entidade e as indústrias processadoras de que o CAR demoraria de dois a três anos para ser implementado.
Polêmica O diretor-executivo do Greenpeace Internacional, Kumi Naidoo, causou polêmica ontem ao defender a agroecologia como modelo de produção, em substituição à larga escala.
Visão Para a entidade, o principal problema hoje no mundo não é a produção insuficiente de alimentos, mas sim os padrões de consumo nos países desenvolvidos, que precisam mudar.
Mercado de cacau deve ter mais 5 anos de deficit
O deficit no abastecimento mundial de cacau vai continuar por ao menos mais cinco anos. A previsão é de Jean Marc Anga, diretor-executivo da Organização Internacional do Cacau (ICCO).
Segundo ele, o consumo cresce a um ritmo mais acelerado do que a oferta, impulsionado pela demanda de mercados tradicionais, como EUA e Europa, e de emergentes, como a China.
A produção, por sua vez, sofre com o menor interesse dos agricultores na cultura. "Devido aos preços baixos dos últimos anos, muitos produtores na África deixaram o cacau para produzir óleo de palma ou látex", diz.
A previsão da entidade para este ano é de um deficit de 115 mil toneladas. O cacau é a commodity mais valorizada dos últimos 12 meses.

quarta-feira, 12 de março de 2014

O Brasil como potência sustentável: O boom da soja no Mato Grosso não deixou um rastro de pobreza, mas as fazendas do Estado ainda estão longe de serem sustentáveis

STEPHEN PORDER, LEAH VAN WEY E LUIZ MARTINELLI
Trabalhamos há anos para compreender os ecossistemas tropicais e a maneira pela qual as pessoas os utilizam, mas nunca vimos fazendas tão vastas ou de crescimento tão rápido quanto as de Mato Grosso.
Essas fazendas, com incentivos adequados e utilizando-se das melhores técnicas agrícolas, poderiam se tornar um modelo mundial de desenvolvimento sustentável e compensar a perda de serviços ambientais causadas pelo desmatamento inicial que provocaram.
Nos últimos 15 anos, as fazendas do Mato Grosso ajudaram a fazer do Brasil uma potência agrícola mundial. Ao contrário das gigantescas fazendas dos Estados Unidos e Europa, essas não deixaram rios sufocados com algas em função da poluição por fertilizantes (pelo menos não ainda). A fauna e a flora se mantiveram nas áreas onde os ecossistemas nativos foram preservados. Diferentemente dos ciclos da borracha, ouro e juta, o boom da soja não deixou um rastro de pobreza.
Mas essas fazendas ainda estão longe de serem sustentáveis. Para tanto, os agricultores precisariam congelar totalmente o desmatamento, legal e ilegal, e liderar esforços para produzir mais comida em menos terra. Em 2006, os produtores de soja aderiram a uma moratória da soja que desacelerou consideravelmente o desmatamento ilegal. Para todos os efeitos, a moratória é fundamental, mas insuficiente, porque os agricultores ainda têm direito legal de desmatar terras que controlam, e o estão fazendo rapidamente.
Uma previsão sombria surge porque as florestas e fazendas do Mato Grosso estão interligadas pela água. Os ecossistemas intactos que cercam as fazendas agem como uma bomba gigantesca de água, reciclando a chuva da região. Estudos demonstram que a continuação do desmatamento ameaça essas bombas. A água que não retorna à natureza por meio da bomba corre para os rios, aumentando a erosão dos solos e alagando áreas ribeirinhas.
Se o desflorestamento mantiver seu ritmo atual, a precipitação pluviométrica poderá diminuir de 10% a 15% no Mato Grosso. Uma estação seca mais longa dificultará o cultivo de duas safras anuais. E é essa dupla safra que oferece os maiores benefícios sociais e econômicos.
A conexão entre fazenda e floresta vai ficando, desse modo, mais importante e mais delicada. O único caminho para a sustentabilidade está na preservação de porção suficiente da vegetação natural da região. Para tanto é necessário mitigar a pressão nas florestas. Além de fortalecer o Código Florestal, é preciso trazer de volta o gado ao campo, uma abordagem com benefícios para a floresta e o solo.
No momento, a soja produzida no Mato Grosso é usada como ração de animais na Europa e na China, levando nutrientes do solo brasileiro. Ao mesmo tempo, o vasto rebanho bovino brasileiro pasta em terras separadas das imensas áreas cultivadas do país. A separação entre a produção vegetal e animal, que se tornou uma tendência mundial, tem resultado na poluição dos rios e na necessidade de adubação das terras aráveis para substituir os nutrientes perdidos pela ausência do excremento animal.
Um compromisso com o desmatamento zero e com a reintegração de animais na agricultura tornaria o agronegócio brasileiro líder mundial no movimento para a produção sustentável de alimentos. Esperamos que essa oportunidade seja aproveitada e que as florestas, das quais as lavouras dependem, possam ser preservadas.

quinta-feira, 6 de março de 2014

Fraude à lei: Bancada ruralista já tenta flexibilizar o Código Florestal

Caso haja concordância do governo, medidas podem favorecer os grandes proprietários que desmataram
Integrantes da Frente Parlamentar da Agropecuária querem encontro com o ministro da Casa Civil
AGUIRRE TALENTODE BRASÍLIA
Representantes do Ministério da Agricultura e do setor ruralista têm pressionado o governo federal a flexibilizar as regras de implantação do novo Código Florestal, que estão sendo finalizadas pela Casa Civil da Presidência.
Caso tenham a concordância do governo, as medidas sugeridas podem favorecer grandes proprietários rurais que desmataram.
Um dos pontos se refere ao Programa de Regularização Ambiental, que prevê a conversão de multas aplicadas até 2008 em serviços de recuperação ambiental.
O Ministério da Agricultura propôs à Casa Civil que a conversão das multas inclua a aplicação de uma advertência aos desmatadores.
Folha apurou que a ideia desagradou ao Ministério do Meio Ambiente.
Outro ponto, defendido pelos integrantes da Frente Parlamentar da Agropecuária e pelo Ministério da Agricultura, refere-se ao cadastramento de imóveis no Sicar (Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural).
A bancada ruralista quer permitir que seja feito um cadastro para cada matrícula de um imóvel rural, em vez de um cadastro pela área total do imóvel.
Isso porque é comum que imóveis rurais grandes estejam divididos em áreas menores com diferentes registros. Se o Sicar aceitar o cadastro por matrícula, é possível que o proprietário se beneficie com regras para pequenas propriedades, apesar de o imóvel rural ser um só.
Por exemplo: os imóveis de até quatro módulos fiscais (unidade usada para medidas agrárias) têm obrigação menor em relação à recuperação florestal.
O novo Código Florestal foi sancionado em 2012 com apoio dos ruralistas.
Um conjunto de regras ainda está sendo finalizado para pôr em prática as medidas previstas na legislação.
Falta a publicação de uma instrução normativa sobre o Sicar, no qual todos terão que se cadastrar, e de um decreto sobre o Programa de Regularização Ambiental, pelo qual produtores vão restaurar áreas já desmatadas.
A implantação dessas medidas já está atrasada.
Integrantes da Frente Parlamentar da Agropecuária se reuniram na semana passada com a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, e abordaram o assunto.
Eles também querem se encontrar com o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante.
"Você pode ter cem hectares, mas com quatro matrículas distintas, aí cai para 25 hectares cada. As condições de reserva legal e de APP (Área de Proteção Permanente) são diferentes. Diminuem as exigências para o produtor", disse o deputado federal Luis Carlos Heinze (PP-RS), o presidente da frente.
O setor ambientalista, porém, é contra esse novo critério para os cadastros.
"Com isso, as concessões dadas para os pequenos produtores poderão se estender aos médios e grandes", disse Raul do Valle, advogado do Instituto Socioambiental.

DIVERGÊNCIAS NO CÓDIGO FLORESTAL
Sicar (Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural)
Proprietários rurais terão que se cadastrar, mas o início de funcionamento do sistema depende ainda da publicação de uma instrução normativa
O QUE QUER O MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE
1 Uma propriedade rural grande dividida em várias matrículas deve ter só um cadastro por área total no Sicar
2 As multas anteriores devem ser transformadas em recuperação ambiental
O QUE QUER A BANCADA RURALISTA
1 Se a propriedade tem várias matrículas, o produtor deve ter a opção de fazer um cadastro por matrícula
2 Reunião deve ser feita entre os governos federal e estaduais para definir como ficaria a conversão de multas
Programa de Regularização Ambiental
Proprietários que desmataram devem aderir para recuperar áreas. Quem foi multado terá penalidade convertida em recuperação ambiental
O QUE QUER O MINISTÉRIO DA AGRICULTURA
1 Se a propriedade tem várias matrículas, o produtor deve ter a opção de fazer um cadastro por matrícula
2 As multas anteriores devem ser transformadas em recuperação e advertência
POSSÍVEIS CONSEQUÊNCIAS
- Se o Sicar aceitar cadastro por matrícula, grandes proprie-tários podem se beneficiar de regras para pequenos e médios
- Sugestão de advertência pode abrir brecha para anistia das multas, na avaliação do Ministério do Meio Ambiente